CERRAÇÃO



BRUMA


Eu preparo uma canção
Em que minha mãe se reconheça,
Todas as mães se reconheçam,
E que fale como dois olhos.
Caminho por uma rua
Que passa em muitos países.
Se não me veem, eu vejo
E saúdo velhos amigos.
Eu distribuo um segredo
Como quem ama ou sorri.
No jeito mais natural
Dois carinhos se procuram.
Minha vida, nossas vidas
Formam um só diamante.
Aprendi novas palavras
E tornei outras mais belas.
Eu preparo uma canção
Que faça acordar os homens
E adormecer as crianças.¹

Em português:

Eu caminho por uma rua que passa em muitas culturas. Se não a trilham, eu a percorro. Ora caminho só; caminho de braços abanando ou de braços cruzados, de braços abertos ou pondo as mãos nos bolsos.
Caminho depressa e me deparo com uma cena de duas pessoas. A cada passo vejo um pouco melhor. Noto uma criança e uma adulta.
As duas estão sentadas. A menor de frente a uma mesinha; do lado oposto, sentada de banda, a mais velha. A menina enche suas mãozinhas com as pedrinhas ao redor e atira com força sobre a mesa. A mulher recolhe as pedras e as solta ao chão. Como na história em que alguém recolhia estrelas-do-mar e as devolvia às águas; senão todas, àquelas salvava. A menina enche suas mãozinhas com as pedrinhas ao redor e rindo as atira com força sobre a mesa. A mulher, olhando à frente, recolhe as pedras e, suave, as solta ao chão. Como os índios brasileiros que não batem nem castigam as crianças que destroem as obras em cerâmicas produzidas pelas mães; permitindo à criança aprender pela observância, não pela punição.
Eu caminho por uma rua que passa em muitas culturas. Se não a trilham, eu a percorro. Caminho com um irmão; ora caminhamos de braços dados, ora com apertos de mãos.
Caminhamos nem rápido nem devagar; caminhamos normal e deparamos com uma cena onde dois homens andam de braços dados. Um, de meia idade e o outro um pouco mais velho. Parece um filho com seu pai ou talvez dois irmãos; um com necessidade especial sendo cuidado pelo mais novo. O importante, porém, é que a cada passo vemos um pouco melhor.
A dupla segue sua vida; em uma bicicleta dois garotos passam por eles. O de trás fala: “São dois barbudos!” e ambos gritam “velhos barbudos, velhos barbudos”. Um dos homens parece ouvi-los, mas a insignificância dos meninos o faz ignorá-los. Simplesmente andam olhando o céu, as árvores e ouvindo a significância dos pássaros.
Eu caminho por uma rua que passa em muitas culturas. Se não a trilham, eu a percorro. Caminho acompanhado; ora caminhamos de braços dados, ora trocando afagos, ora lado a lado.
Caminhamos devagar; caminhamos sem pressa e deparamos com uma cena onde pessoas conversam. Há um “iluscritor” que é desenheiro e escrivinho, há uma artista que dança artesanato e há outros mais. Discutem a relevância das enchentes; belas, sedutoras e assustadoras.
- A de setenta e nove – o iluscritor compartilha – dos trinta e sete degraus da escadaria do fundo do quintal até minha casa em Nova Era, a enchente alcançou vinte e nove... Mas fascinava vê-la mudar gradativamente a cor da água da piscina. Apesar do trabalho para limpá-la depois. – Rimos e ficamos sérios: A enchente toma conta de tudo.
- Como a água está sempre em movimento; a enchente é uma deusa sem rosto, mas com longos braços que levam coisas e tiram outras – a artista compartilha –mudando tudo, mudando todos.
Eu caminho por uma rua que passa em muitas culturas. Se não a trilham, eu a percorro. Caminho lentamente sem pressa. Já caminhei sozinho y já caminhei acompanhado. Mas sempre caminho comigo. E agora caminho ao sol, indo à neblina...

Foto de Iarel Iarel.

En español:

Camino por una calle
Que atraviesa muchos países.
Si no me ven, los veo
Y saludo viejos amigos.¹

Camino por una calle que atraviesa muchas culturas. Si no la trillan, la recorro. Oro camino solo con mis brazos abanando o cruzados, con los brazos abiertos o con las manos en los bolsillos.
Camino deprisa y me deparo con una ensena de dos personas. A cada paso veo un poco mejor. Percibo una niña y una adulta.
Las dos están sentadas. La chica de frente a una mesita; del lado opuesto, sentada de flanco, la mayor. La niña llena sus manitas con las piedritas de alrededor y las tira con fuerza sobre la mesa. La mujer recoge las piedras y las deja volver al suelo. Como en la historia donde alguien quitaba de la arena las estrellas del mar para volverlas al océano; sino todas, aquellas salvaba. La niña llena sus manitas con las piedritas de alrededor y riendo las tira fuerte sobre la mesa. La mujer, mirando su frente, recoge las piedras y, suave, las deja volver al suelo. Como los indios del sur de Latinoamérica que no zurran ni castigan los niños que destruyen las obras en cerámicas producidas por las madres; permitiéndoles aprender por observancia, no por punición.
Camino por una calle que atraviesa muchas culturas. Si no la trillan, la recorro. Camino con un hermano; ora caminamos de brazos dados, ora apretando las manos.
Caminamos ni rápido ni despacio; caminamos normal y deparamos con una ensena donde dos hombres andan de brazos dados. Un ya cano y el otro aún mayor. Tal vez padre e hijo o tal vez dos hermanos; uno con necesidad especial recibiendo cuidado del benjamín. Pero, solo importa que a cada paso percibimos mejor las cosas.
El par sigue su vida; en una bicicleta dos muchachos pasan por ellos. El de tras habla: “¡Son dos barbudos!” y da bici gritan: “viejos barbudos, viejos barbudos”. Uno de los hombres, el más listo, parece oírlos, sin embargo, la insignificancia de los chicos lo haz ignorarlos. Solamente andan mirando el cielo, los árboles y oyendo la significancia de los pájaros.
Camino por una calle que atraviesa muchas culturas. Si no la trillan, la recorro. Camino acompañado; ora caminamos de brazos dados, ora trocando mimos, ora flanco a flanco.
Caminamos despacio; caminamos sin prisa y deparamos con una ensena donde personas platican. Hay un “iluscritor” que se dedica a dibujar frases y a escribir imágenes, hay una artista que danza artesanías y hay otros más. Discuten la relevancia de las inundaciones; bellas, seductoras y asustadoras.
- Aquella que ocurrió en Brasil en 1979 – comparte el iluscritor – de los treinta y siete peldaños de la escalera del patio hasta mi casa en Nova Era, la inundación alcanzó veintinueve… Pero, como fascinaba verla cambiar poco a poco el color del agua de la piscina. A pesar del difícil que era limpiarla después. – Reímos y nos quedamos serios: La crecida de agua toma cuenta de todo.
- Como el agua está siempre en movimiento; la inundación es una diosa sin rostro, pero con largos brazos que llevan cosas y quitan otras – comparte la artista – cambiando cosas, cambiando personas.
Camino por una calle que atraviesa muchas culturas. Si no la trillan, la recorro. Camino lentamente sin prisa. Ya la caminé solo y la caminé acompañado. Pero siempre camino conmigo. Y ahora camino al sol, indo a la neblina…


¹ ANDRADE, Carlos Drummond de. Canção Amiga. Disponível http://www.entreculturas.com.br/2010/08/carlos-drummond-de-andrade-cancao-amiga/ . Acesso 21 Mai 2018. Traducción libre del segundo verso al castellano.

Daniel Cristino e Maura Gerbi. Que a “prefeitável” dupla Vá e Vença! Pois:
Verde que te quero verde
Verde e amarelo
Não o se vende pato amarelo
Não o coxinha batedor de panela.

 Rubem Leite é escritor, poeta e crontista. Escreve ao Ad Substantiam ocasionalmente às quintas-feiras; e todo domingo no seu blog literário: aRTISTA aRTEIRO.  É professor de Português, Literatura, Espanhol e Artes. É graduado em Letras-Português. É pós-graduado em “Metodologias do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura na Educação Básica”, “Ensino de Língua Espanhola”, “Ensino de Artes” e “Cultura e Literatura”; autor dos artigos científicos “Machado de Assis e o Discurso Presente em Suas Obras”, “Brasil e Sua Literatura no Mundo – Literatura Brasileira em Países de Língua Espanhola, Como é Vista?”, “Amadurecimento da Criação – A Arte da Inspiração do Artista” e “Leitura de Cultura da Cultura de Leitura”. Foi, por duas gestões, Conselheiro Municipal de Cultura em Ipatinga MG (representando a Literatura).
Foto do Vinícius Siman.

Esta ideia foi fecundada e gestada em vinte de maio de 2018; parida na manhã seguinte e passou os próximos três dias a crescer para te conhecer, leitor/a.

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